O Programa INW CONECTA chegou ao 8º encontro e, para encerrar este ciclo, teve como tema “Resiliência e superação: Das periferias para o mundo”. Para inspirar os ouvintes, 4 convidados compartilharam suas trajetórias pessoais e profissionais. De origem periférica, todos superaram suas condições sociais por meio do comprometimento com o estudo e o trabalho. Mediado por William Ruiz, gerente do Instituto Nelson Wilians, foram convidados o Gilson Rodrigues, coordenador nacional do G10 das favelas e conhecido também como prefeito de Paraisópolis; o Pablo Feitosa, diretor executivo de novos negócios da NWADV; a Viviane Coelho, professora na Escola Dom Bosco de Recife e especialista em gestão de pessoas; e o empresário Deivid Gomes, instrutor de aprendizagem nao Projov.
Gilson compartilha a transformação da realidade de Paraisópolis
Gilson explica o que é o G10 das favelas: “O G10 é inspirado no G7, o bloco de 7 países ricos. E assim como eles, nós queremos nos posicionar como um bloco de potência e agentes de transformação como desenvolvedores e empregadores, e não como marginais, coitadinhos ou carentes como idealizam a favela. É um conjunto de iniciativas, sendo que em 2018 e 2019 as 10 favelas movimentaram R$ 7 milhões de reais.”
O líder comunitário trás um pouco da sua história e de Paraisópolis. Conta que o território celebra 100 anos em 2021, sendo que 85% da população é formada por nordestinos em busca de oportunidades na capital paulista. Com 14 irmãos, ele é natural da Bahia e lembra que, quando chegou em São Paulo, precisava falar que morava no Morumbi, pois as oportunidades não chegavam se dissesse que morava em Paraisópolis. Quando perdeu sua mãe, e já sem a presença do pai, cresceu ouvindo que “não viraria gente”, e isso foi motivação para mudar o rumo da sua história. Participou de projetos sociais na escola, formou grêmios estudantis e passou a oferecer aulas para os moradores. Como presidente do grêmio, articulou parcerias com associações do bairro e passaram a fazer melhorias por meio de solicitações na gestão pública e também parcerias com iniciativa privada. “Nesse conjunto de reivindicações, nós construímos o maior projeto de urbanização do mundo, que trouxe mais de um milhão de reais de investimentos para a comunidade”.
Ele conta que o processo de atuação foi tão bem sucedido que Paraisópolis passou a ser referência em mais de 14 países, como Holanda, Inglaterra, Paris e África do Sul. Explica ainda que o G10 estava com muitas perspectivas de ação para 2020, mas com a chegada da Pandemia foi necessário concentrar ações para que as pessoas não morressem. “São casas pequenas e aglomeradas. Se não fizéssemos nada, a situação ficaria muito grave. Então decidimos criar nossas próprias iniciativas para salvar a população. No modelo ‘presidente de rua’, a cada 50 casas um morador auxilia no processo de cuidados com o COVID e, sempre que aparece algum caso essa pessoa aciona a ambulância”. Mas Gilson explica o agravante do SAMU ter dificuldades em acessar as favelas, por isso contrataram 3 ambulâncias e equipes médicas, que já fizeram mais de 4.500 atendimentos
Outra iniciativa do bairro foi transformar 2 escolas em casa de acolhimento, a fim de distanciar o isolamento social entre os moradores, já que muitos moram numa mesma casa. Este modelo foi replicado em outros 8 estados como política pública. As iniciativas foram atestadas entre as melhores na gestão da Pandemia, sendo que a mortalidade no bairro é menor com relação à cidade de São Paulo. Durante o encontro, ele faz um passeio pelo pelo pavilhão apresentando apresentando o modelo de trabalho e as marmitas que estavam sendo preparadas para distribuição, cerca de 4.000 unidades por dia. “O Brasil não vai ser mais solidário se a gente não fizer a nossa parte, porque o novo normal não existe na favela. Não é normal que falte água em Paraisópolis, ou que as ambulâncias do SAMU não cheguem até aqui. Ainda existe uma série de anormalidades quando querem pregar um novo normal que ainda não aconteceu. Temos que nos indignar, porque nós ainda estamos buscando o nosso normal”.
Pablo aconselha os ouvintes sobre a transformação pela educação
Pablo se identifica com a história de Gilson, já que nasceu no Morro da Lagartixa, favela carioca com menor IDH da América Latina. Ele cresceu e estudou na favela do Acari, quando percebeu que a única maneira de mudar de vida seria por meio da educação. Comenta como um professor, o Marcelo Rolin, foi transformador na vida dele, sendo que se conheceram na época em que Pablo colhia alimentos da xepa do Ceasa para se alimentar.
Ele lembra que, desde criança, tinha empregos simples e informais para contribuir com a família, já que seus pais eram autônomos e a renda era imprevisível. Menciona ainda a dificuldade de um emprego formal, já que moravam em área de risco. “A maioria dos meus colegas acabaram indo pra outro caminho, como o tráfico e as drogas, e hoje muitos deles já não estão mais entre nós. Mas a partir do momento que somos protagonistas das nossas próprias vidas, a gente deixa de ser marcha de manobra.”
“Não pensem que eu era o melhor aluno. Eu era mediano, mas não é só a genialidade e conhecimento que farão você progredir. Uma pessoa pode receber a melhor educação, mas ela precisa também ter algo que nós aqui já temos: raça, garra e determinação”. Ele conta que, por meio de projeto social, praticou atletismo e se inspirava no corredor Robson Caetano. “Mire em pessoas que são exemplos, e não associe prosperidade ao sucesso financeiro. Também não se inferiorize por ter nascido onde nasceu. Isso é uma vantagem competitiva, porque tudo que viveu te deu musculatura para fazer a diferença”.
Ele conclui com o seguinte pensamento: “Visão sem ação é só um sonho, ação sem visão é só um passatempo. Já uma ação com visão e resiliência muda a sua história, da sua família e impacta várias pessoas ao seu redor.”
Viviane conta como o estudo revolucionou sua história
Viviane traz a importância a equidade e a dificuldade de meritocracia mesmo dentro dos próprios lares. Conta que, sendo mulher em uma família machista, ela era direcionada às atividades domésticas enquanto os irmãos eram estimulados ao estudo. Então, ela percebeu que os estudos poderiam ser uma forma de sair da realidade de cuidadora do lar.
Crescida no subúrbio de Afogados, em Recife, lembra que aos 16 anos pediu à sua mãe a emancipação e, aos 17 anos iniciou seus estudos na universidade pública. “Na minha situação de desigualdade, minha solução para ser aprovada no vestibular foi contar com a rede de apoio de amigos, que me emprestavam livros para que eu pudesse me preparar.” Ela se formou em Letras, passou a ministrar aulas, percebeu o quanto conhecimento pode revolucionar e hoje atua em uma instituição que estimula o protagonismo de jovens e adolescentes.
Deivid relembra sua trajetória pessoal e profissional
Também nascido em região de vulnerabilidade, na época conhecida como Favela de Santo Antônio, Deivid fazia coleta de material reciclável e por isso raramente ia à escola, tendo seus estudos comprometidos. Alguns anos depois, sua família se mudou para Taboão da Serra e lá foram vitimados por uma enchente, perdendo todos os bens que tinham à época. “Mas tinha algo que minha mãe sempre falava pra mim: ‘Você é mais do que vencedor’. Eu entendia que quando a vida derrubava, a gente não tinha muito tempo pra ficar no chão.”
Ele lembra de quando foi morar com a avó em função do alcoolismo do pai. Naquela época, passou a trabalhar e contribuir com as finanças de casa, mesmo recebendo pouco. E lembra que, mesmo que tivessem poucos recursos, ainda se sentiam todos felizes. “Eu sempre gosto de lembrar meus alunos: Você não é o bairro em que você mora. E comunidade é o lugar onde um olha pelo outro”
Conta com muito carinho sobre quando conheceu sua namorada, hoje esposa, e decidiram guardar pequenas partes que sobravam do salário para construírem o sonho de ter uma família. Lembra também do seu primeiro emprego registrado e o quanto se desenvolveu dentro da empresa. “Quando eu me casei, já tinha dinheiro para fazer o casamento, comprar os móveis a vista e ainda sobrou uma parte para comprar um terreno onde hoje é minha casa. Eu digo para vocês que vale a pena sonhar. Você pode estar passando por um momento difícil, mas não vai ser assim a vida toda. E quando me perguntam se eu ainda tenho algum sonho, eu digo que quero mudar o mundo. Posso não mudar o mundo inteiro, mas ao menos os das pessoas que me cercam, seja através de um emprego, da educação ou de um conselho.”
O INW agradece a disponibilidade dos convidados que compartilharam com mais de 100 ouvintes seus históricos pessoais e profissionais carregados de tamanha resiliência e superação. Reforçamos que os 8 encontros deste ciclo estão disponíveis no YouTube e pode ser acessado clicando aqui.