Educação em direitos: o papel da informação na construção de uma sociedade mais justa

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Em sociedades historicamente marcadas por desigualdades estruturais e pela exclusão de amplas parcelas da população dos processos decisórios e formativos, o acesso à informação jurídica emerge como uma das chaves para a construção de uma cidadania plena. No contexto brasileiro, entretanto, esse acesso ainda é profundamente assimétrico.

Apesar de o ordenamento jurídico nacional reconhecer e proteger uma série de direitos fundamentais, sua efetividade permanece limitada por diversos fatores. Entre eles, destacam-se a linguagem técnica do Direito, a ausência de políticas públicas de educação em direitos e a naturalização da desigualdade como elemento constitutivo da vida social.

Nesse cenário, a educação em direitos não pode ser concebida como um mero apêndice das políticas educacionais, mas, sim, como um vetor de transformação social com potencial emancipatório.

Marcos da educação em direitos no Brasil

Historicamente, a institucionalização da educação em direitos no Brasil encontrou marcos relevantes que merecem ser destacados. A Constituição Federal de 1988 – norma de maior hierarquia no sistema jurídico brasileiro –, ao instituir o Estado Democrático de Direito e afirmar a dignidade da pessoa humana como um de seus fundamentos, inaugurou uma nova fase, na qual o direito à informação e à educação tornou-se essencial à concretização da cidadania.

Na esteira desse processo constituinte, emergiu o Programa Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), criado em 2003. Esse programa sistematizou diretrizes para ações educativas orientadas pelos princípios da universalidade dos direitos humanos, da equidade, da justiça social, da participação democrática e da transversalidade.

Ainda que tenha representado um avanço significativo, o PNEDH encontrou desafios em sua implementação, frequentemente obstada pela descontinuidade administrativa e pela fragilidade institucional dos programas públicos.

Desafios contemporâneos da educação em direitos

Entretanto, o desenvolvimento de uma cultura jurídica acessível e participativa enfrenta inúmeros desafios contemporâneos. A fragmentação de políticas educacionais, a carência de formação específica para educadores no campo dos direitos humanos e os discursos antidemocráticos que ganham força no espaço público dificultam a consolidação de uma educação em direitos efetiva e sustentável.

Em diversos contextos, iniciativas isoladas desenvolvidas por organizações do terceiro setor acabam por suprir lacunas deixadas pelo Estado, evidenciando, assim, uma ausência de articulação sistêmica e de compromisso institucional com a formação cidadã.

Além disso, o avanço de narrativas que deslegitimam os direitos humanos promove uma leitura restrita da cidadania e corrói as bases do pacto democrático que sustenta a convivência plural.

Tecnologia, redes sociais e educação em direitos

Neste cenário, o papel da tecnologia e das redes sociais torna-se ambivalente. Por um lado, essas ferramentas podem democratizar o acesso à informação jurídica, permitindo que conteúdos educativos alcancem públicos historicamente excluídos. Por outro, também servem como vetores de desinformação, discursos de ódio e interpretações deturpadas do ordenamento jurídico.

As plataformas digitais, portanto, abrigam tanto perfis que se dedicam à popularização do Direito, com linguagem acessível e conteúdo didático, quanto páginas que instrumentalizam conceitos jurídicos de forma sensacionalista, contribuindo para a confusão conceitual e a fragilização do senso crítico da população.

Nesse sentido, a alfabetização digital e jurídica torna-se imperativa para que a informação jurídica se converta, de fato, em ferramenta de conscientização e mobilização coletiva.

Educação em direitos como estratégia de inclusão e transformação

A educação em direitos, quando pensada de maneira integrada a práticas pedagógicas dialógicas, ao desenvolvimento de habilidades socioemocionais e à valorização da experiência vivida, revela-se não apenas como uma estratégia de inclusão social, mas como um verdadeiro ato político.

Iniciativas que aliam teoria e prática, como as promovidas pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e outros coletivos de base, demonstram o potencial transformador da escuta ativa e da pedagogia da presença, conforme propunha Paulo Freire em sua obra “Pedagogia do Oprimido” (2019).

Nesses espaços, jovens periféricos e educadores constroem saberes a partir do cotidiano, ressignificando o Direito como instrumento de luta, identidade e pertencimento.

Saberes populares e reconhecimento jurídico

Como afirma Boaventura de Sousa Santos (2001), é preciso “lutar contra o desperdício da experiência”, resgatando o saber popular como forma legítima de conhecimento jurídico.

Dessa forma, torna-se evidente que o desconhecimento dos próprios direitos não decorre de incapacidade individual, mas da perpetuação de uma cultura jurídica excludente e elitizada.

A transformação desse quadro exige, portanto, não apenas investimentos estruturais, mas o reconhecimento de que o conhecimento jurídico pertence a todos os sujeitos sociais.

Educação em direitos como eixo da justiça social

Reconhecer o direito à informação como eixo central da justiça social reafirma a vocação da educação em direitos para romper com estruturas de silenciamento e exclusão.

A escola, a comunidade, os meios digitais e os espaços de convivência devem ser compreendidos como territórios educativos, capazes de articular saberes e construir pontes entre a norma jurídica e a vida cotidiana.

Investir em educação em direitos é, portanto, comprometer-se com a construção de uma sociedade mais justa, plural e democrática. É garantir que todas as pessoas possam compreender, reivindicar e transformar sua realidade.

Assim, a informação, quando traduzida em consciência e ação, deixa de ser mercadoria e torna-se um bem comum — fundamento para a construção de um mundo mais justo.