A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL PARA ENFRENTAMENTO DE DESASTRES CLIMÁTICOS

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A participação social é fundamental para a promoção de políticas públicas transparentes e eficazes, pois permite que as pessoas se envolvam diretamente na tomada de decisões, garantindo que suas vozes sejam ouvidas e suas preocupações sejam levadas em consideração. Essa participação ativa é essencial para a construção de uma democracia robusta e responsiva, onde as políticas refletem as necessidades e aspirações da sociedade como um todo.

Um exemplo claro da importância da participação social pode ser observado na resposta a desastres naturais. Quando as comunidades afetadas têm a oportunidade de contribuir na formulação de políticas de mitigação e resposta a desastres, as soluções tendem a ser mais eficazes e adequadas às realidades locais. As pessoas que vivenciam os impactos diretos desses eventos possuem conhecimentos e experiências valiosas que podem orientar a criação de políticas mais práticas e eficazes. Ou seja, ao permitir que os cidadãos se envolvam diretamente na tomada de decisões garantimos de forma eficaz que suas vozes sejam ouvidas e suas preocupações levadas em consideração. Este processo não só fortalece os pilares de uma democracia robusta, mas também aumenta a eficácia e a transparência das políticas implementadas.

Uma ampla diversidade de perspectivas é fundamental quando se trata de formular políticas que verdadeiramente representam a diversidade da população. Dessa maneira, a participação social garante que diferentes grupos, comunidades e indivíduos tenham a oportunidade de contribuir com suas experiências e conhecimentos únicos. Isso não apenas enriquece o processo decisório, mas também resulta em políticas mais inclusivas e equitativas, capazes de atender às necessidades variadas de uma sociedade em constante mudança.

Essa abordagem participativa é igualmente crucial em questões ambientais, especialmente no contexto das mudanças climáticas. As mudanças climáticas representam um desafio global que exige soluções inclusivas e abrangentes. A participação da sociedade garante que as políticas públicas sejam desenvolvidas de maneira justa e equitativa, levando em conta as necessidades das populações mais vulneráveis e garantindo que as ações climáticas não perpetuem ou ampliem desigualdades existentes.

Quando a sociedade civil participa ativamente do processo de elaboração de políticas ambientais, é possível promover o conceito de Justiça Social. Isso significa que todos os grupos sociais, especialmente aqueles historicamente marginalizados, têm uma voz na criação de políticas que afetam diretamente suas vidas e seu meio ambiente. Políticas públicas construídas com base na justiça social buscam distribuir de forma equitativa os benefícios e os encargos das ações ambientais, assegurando que ninguém seja desproporcionalmente prejudicado

Além disso, a participação social fortalece a transparência e a accountability (responsabilização) das ações governamentais. Governos que envolvem a população na tomada de decisões tendem a ser mais transparentes, pois necessitam justificar e explicar suas escolhas de maneira clara e aberta. Esse processo participativo contribui para a construção de confiança entre o governo e os cidadãos, essencial para a implementação bem-sucedida de políticas públicas.

Nesse sentido, a participação social não apenas enriquece a formulação de políticas públicas com perspectivas diversificadas, mas também fortalece a democracia, promove a justiça social e assegura que as ações governamentais sejam mais transparentes e responsáveis. É uma ferramenta poderosa para garantir que as políticas públicas realmente atendam às necessidades da sociedade e promovam um desenvolvimento sustentável e inclusivo. A participação social não apenas capacita os cidadãos, mas também educa. Envolver-se na elaboração de políticas públicas é uma forma poderosa de educar os indivíduos sobre o funcionamento do governo e seus próprios direitos e responsabilidades cívicas. Portanto, isso fortalece a conscientização cidadã e promove uma cultura de participação ativa na vida democrática.

 

ADOÇÃO DE MEDIDAS DE PREVENÇÃO EM FACE DOS EXTREMOS CLIMÁTICOS

No Brasil, a necessidade de pensarmos e agirmos para a prevenção de desastres climáticos já se tornou evidente. Toma-se como exemplo as cidades de Jaboatão dos Guararapes e Recife, ambas localizadas no estado de Pernambuco e, atualmente, o estado do Rio Grande do Sul, que sofreram e ainda sofrem com desastres naturais provocados por eventos extremos, agravados em sua maioria por falta de políticas públicas adequadas de prevenção, mitigação e recuperação de danos provocados por esses eventos.

A tragédia das chuvas em Pernambuco, no ano de 2022, foi marcada como a maior tragédia natural do século no Estado, resultou em 133 mortes e mais de sete mil desabrigados. Diante disso, foram feitos esforços que visaram não apenas lidar com as consequências imediatas da tragédia, mas também criar uma atuação a longo prazo contra futuros desastres naturais.

As principais medidas adotadas que podem ser destacadas foram a criação de uma cooperação entre diferentes níveis de governo, a mobilização da sociedade civil e a criação do Grupo de Engenharia Geotécnica de Encostas, Planícies e Desastres (GEGEP) da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, para desenvolver pesquisas relacionadas ao tema e indicar medidas cientificamente viáveis e eficazes para criação de soluções técnicas de contenção de encostas, movimentação do solo e investimentos em infraestrutura de drenagem para escoamento da água da chuva, soluções que possam ser implantadas em políticas públicas, assim como campanhas de educação e conscientização sobre os riscos de desastres naturais e medidas de segurança que foram intensificadas, envolvendo escolas, comunidades e mídia local.

Além disso, a Defesa Civil do Estado e dos municípios, corpo de bombeiros, entre outros órgãos públicos, têm realizado ações importantes, como levar conhecimento em educação ambiental e cívica aos moradores de áreas de risco e conduzindo simulações de desastre.

Essas ações mostram como a participação social pode ser uma ferramenta importante para prevenir e lidar com problemas que afetam a sociedade. Quando os cidadãos são incentivados a se envolver e a colaborar com os processos decisórios, a sociedade se torna mais resiliente e capaz de enfrentar desafios diversos. No exemplo de Pernambuco, as ações de participação social foram importantes para conscientizar a população para evitar perdas humanas e minimizar os impactos desses desastres naturais, proporcionando ao cidadão uma interação com agentes públicos e multiplicando conhecimento em questões do meio ambiente. Iniciativas como essas não só preparam a comunidade e os agentes públicos para lidar com situações de riscos ambientais como também geram um aumento na participação social, que impacta para tomada de decisões na implantação de políticas de enfrentamento a desastres naturais.

 

DESAFIOS PARA A PROMOÇÃO DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL

A participação social na tomada de decisões para criar e implantar políticas públicas de enfrentamento a desastres naturais enfrenta diversos desafios. Esses desafios podem ser estruturais, culturais, sociais, políticos e econômicos, e é crucial que sejam compreendidos e abordados para garantir uma participação efetiva e inclusiva. A seguir, são detalhados alguns dos principais desafios.

 

Desigualdade social, econômica e acesso à informação

As pessoas inseridas em contexto de vulnerabilidade socioeconômica frequentemente precisam priorizar a sobrevivência diária, o que pode diminuir seu envolvimento em atividades participativas. Em muitas comunidades, o acesso à informação é desigual, com grupos mais vulneráveis tendo menos acesso a recursos educacionais e tecnológicos que permitam sua participação informada nos processos decisórios, fatores que podem limitar a capacidade dos indivíduos de se engajarem ativamente.

 

Complexidade técnica dos assuntos e comunicação ineficaz

As políticas de enfrentamento a desastres naturais frequentemente envolvem aspectos técnicos e científicos complexos. A falta de conhecimento especializado pode dificultar a compreensão e a participação efetiva da população. Aliado a isso, a comunicação entre agentes públicos e comunidade pode ser ineficaz, com informações técnicas sendo transmitidas de maneira pouco acessível ou compreensível para o público em geral.

 

Mobilização comunitária e a falta de infraestrutura

Organizar a participação comunitária requer tempo e recursos, e pode ser difícil engajar um número significativo de pessoas, especialmente em áreas rurais ou de difícil acesso. Em algumas regiões, a infraestrutura necessária para apoiar a participação social como espaços para reuniões e acesso a tecnologias de comunicação muitas vezes é insuficiente ou inexistente. Além disso, as decisões políticas podem ser influenciadas por interesses econômicos ou políticos externos que não refletem as necessidades e prioridades dessa comunidade local.

 

CAMINHOS PARA A PARTICIPAÇÃO SOCIAL

Existem várias maneiras pelas quais a sociedade pode participar na promoção de políticas públicas, não somente em contextos de desastres naturais. Por exemplo, os cidadãos podem participar de consultas públicas sobre novas políticas ou legislações, contribuindo com suas opiniões e sugestões. Além disso, podem se engajar em grupos ou organizações não governamentais que trabalham para influenciar as decisões políticas e promover mudanças. Esses canais de participação permitem que a sociedade civil atue de forma proativa na construção de políticas mais inclusivas e representativas. Conheça alguns caminhos possíveis para exercer a sua participação social:

 

  • Votar nas eleições federais, estaduais e municipais: A forma mais básica e fundamental de participação cívica, quando os cidadãos escolhem seus representantes políticos em todos os níveis de governo. Este ato fortalece a democracia e permite que a voz do povo seja ouvida na formulação de políticas.
  • Conselhos e comitês: Espaços institucionais que oferecem aos cidadãos a oportunidade de discutir e influenciar decisões em áreas específicas, como saúde, educação e meio ambiente. Participar nesses grupos permite uma colaboração direta com autoridades governamentais para melhorar políticas e serviços públicos.
  • Audiências e consultas públicas: Mecanismos que permitem aos cidadãos expressarem suas opiniões e contribuírem com ideias para projetos e políticas antes que sejam implementados. Essas audiências são essenciais para garantir que as decisões governamentais reflitam as necessidades e preocupações da população.
  • Movimentos sociais: Coletivos organizados que buscam promover mudanças sociais e políticas significativas. Esses movimentos trazem à tona questões importantes, mobilizam a sociedade e pressionam autoridades para a implementação de reformas necessárias.
  • Voluntariado em organizações sociais: Participação ativa em organizações que trabalham para melhorar as condições de vida locais, defender interesses comunitários e prestar auxílio em emergências, como desastres naturais. O voluntariado fortalece a coesão social e promove o desenvolvimento comunitário.
  • Orçamento Participativo (OP): Um processo democrático que permite aos cidadãos decidirem diretamente como uma parte do orçamento público deve ser alocada. Isso promove uma gestão mais transparente, inclusiva e eficaz dos recursos municipais, garantindo que as prioridades da comunidade sejam atendidas.

 

Como pode ser observado, existem várias formas de participação social que podem ser exercidas de forma obrigatória ou espontânea, mas todas têm o condão de incentivar um engajamento, promover a conscientização da comunidade sobre os eventos que as atingem causados pelas mudanças climáticas.

Todos os atores sociais possuem capacidade ativa dentro de suas respectivas esferas de atuação, seja através de campanhas de educação pública, eventos comunitários, mídias sociais, criação de leis e ações de políticas públicas,  desempenhando, dessa forma, um papel crucial na resposta a desastres naturais. Isso pode incluir a participação em esforços de socorro e recuperação, bem como a promoção de práticas sustentáveis que podem ajudar a mitigar os impactos futuros das mudanças climáticas.

 

LITÍGIOS CLIMÁTICOS E O DIREITO COMO FERRAMENTA DE PROMOÇÃO DA JUSTIÇA SOCIAL

Nos últimos anos, a recorrência de desastres socioambientais se tornou cada vez mais frequente. O que chama a atenção é que muitas vezes são decorrentes das mudanças climáticas e a falta de preparo social para mitigar os danos. Em concorrência, há a busca pela emancipação social das pessoas em situação de vulnerabilidade e, consequentemente, o aumento da sua participação democrática, ou seja, Justiça Social.

A Justiça Social é um mecanismo de promoção da cidadania, no qual há a fomentação de igualdade de direitos e solidariedade coletiva. Em outras palavras, busca-se a concretização de direitos coletivos, como direito à saúde, direito à educação, direito ao lazer, direito ao trabalho e direito ao meio ambiente sadio e equilibrado. Inclusive, pode-se afirmar que é premissa da própria Constituição Federal de 1988 que estabelece como princípios a cidadania e a dignidade da pessoa humana, além de objetivar o desenvolvimento nacional, erradicação da pobreza e promoção do bem-estar social.

Acontece que quando há a ocorrência de desastres ambientais climáticos, muitos destes direitos são negligenciados, seja pela própria condição da comunidade atingida, por omissão estatal e de toda a sociedade ao redor. E é aí que surgem os chamados litígios climáticos!

Os litígios climáticos é uma tendência de levar à apreciação do Judiciário e aos órgãos ambientais questões relacionadas à gestão de riscos em face das mudanças climáticas. Essas ações buscam fazer com que o Poder Público cumpra o seu dever de segurança com a população e o meio ambiente, seja por meio de criação de políticas públicas, adoção de situações emergenciais, regulamentem sobre a matéria e reparem, eventualmente, os danos causados pela sua omissão.

Sempre que houver a possibilidade de um desastre socioambiental, deve-se pensar e implementar ações de prevenção, mitigação, preparo, resposta e reconstrução da sociedade após os fatos. Isso encontra amparo legislativo no Brasil com a Lei 12.608/2012, que institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, que autoriza a criação de sistemas de monitoramento de desastres, entre outras ações.

CONCLUSÃO

A participação social é uma ferramenta poderosa na promoção de políticas públicas em um contexto de desastres naturais causados pelas mudanças climáticas. Os residentes das áreas afetadas possuem um conhecimento profundo e detalhado do território, das práticas culturais e das vulnerabilidades específicas da região. Esse conhecimento é inestimável para a identificação de riscos e para a elaboração de planos de ação mais eficazes e personalizados.

Ao garantir que as vozes dos cidadãos sejam ouvidas através da participação social permite que as autoridades identifiquem as reais necessidades e prioridades da comunidade. Em vez de impor soluções de cima para baixo, as políticas podem ser moldadas para atender às demandas específicas da população, garantindo que os recursos sejam alocados de maneira mais eficiente e sustentável para todos.

Por fim, nos casos de existência de litígios climáticos, é de suma importância a união entre Poder Público, órgãos do Poder Judiciário e sociedade civil para que sejam adotadas medidas de prevenção e restruturação burocrática, além de criação de políticas públicas capazes de fomentar a participação social como um instrumento catalizador da Democracia.

A inclusão dos cidadãos no processo decisório cria um senso de pertencimento e responsabilidade compartilhada, a participação social promove a educação e a conscientização sobre os riscos, incentivando a adoção de práticas preventivas e a mobilização rápida em emergências, facilitando a elaboração e implementação das medidas propostas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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