O 3º Encontro do Programa INW CONECTA aconteceu na terça-feira (23). Com o tema “Masculinidade Saudável: Homem não chora?”, o bate-papo contou com a participação do Palestrante e Administrador Fábio Manzoli, que possui vasto conhecimento em saúde mental masculina, equidade de gênero e masculinidade saudável. Também compartilharam suas experiências e conhecimentos o Dr. Marcel Daltro, Advogado, Sócio e Diretor Institucional da NWADV, o Dr. Mário Rubens Assumpção Filho, Juiz de Direito no Tribunal de Justiça de São Paulo, e Jalequison Henrique, Instrutor de Formação Profissional na Escola Dom Bosco, em Recife. O encontro foi mediado pela Dra. Anne Wilians, Fundadora e Presidente do INW, que reforça a importância de desconstruir a estrutura patriarcal existente em muitos ambientes.
Fábio conta sobre seu processo de descoberta da masculinidade
Fábio Manzoli conta que a relação com o pai na infância foi causadora de pensamentos e sentimentos muito negativos e autoestima baixa, chegando a ideações suicidas. Quando passou a se abrir sobre suas emoções, especialmente por meio de textos, outros homens começaram a procurá-lo compartilhando das mesmas sensações. “Em alguns momentos eu tinha medo de mim, eu era tomado por um ódio por completo, a ponto de me perguntar onde poderia chegar com aquele comportamento. Sair dessa condição disruptiva foi um grande benefício na minha vida, porque hoje não percebo mais essa energia violenta que foi implantada na minha infância.”
Quando Dra. Anne comenta o fato de comportamentos como esses estarem presentes em diversos lares e a importância de não reproduzir ou normalizar estas condições, Fábio conta que na infância reprimiu muitas vezes suas emoções, de forma que o único sentimento restante foi a raiva. Acrescenta que, sem as outras emoções presentes, como o medo, a insegurança ou outra vulnerabilidade, não é possível ter empatia pelo próximo.
“‘Engole o choro senão vai ter!’ era uma fala do meu pai com dedo em riste e segurando um chicote. Eu fui ensinado a não chorar e era fechado em um quarto escuro quando tinha medo do bicho-papão. Toda essa repressão constante na infância reverberou na minha inteligência emocional. Eu sei que meu pai também teve uma infância dura, e sei que hoje ele lamenta e se arrepende”.
Ele reforça o aumento do número de suicídio e afirma: “Numa ideação suicida, é importante saber que aquela sensação vai passar. Há muitos grupos de apoio disponíveis, como o Projeto JUSTICEIROS. A ajuda não retira nossa hombridade, pelo contrário: nos transforma em homens melhores.” E conclui: “Posicionem-se quando ouvirem uma mensagem sexista, misógina, machista, racista”.
Dr. Mário explica as diferentes formas de violência
Iniciando sua fala, Dr. Mário faz um convite à reflexão “Quantas masculinidades nós temos? Este número não existe, porque nós somos únicos. Viemos de uma estrutura normativa: ‘eu faço, porque meu pai fez e meu avô fazia’. Mas não adianta normatizar o estereótipo masculino, sobre ser mais forte, mais fraco ou mais sensível. O que nos define é nosso caráter, nossa moral para viver em sociedade. Em um relacionamento, se você se tornou alguém que não gostaria de ser para se encaixar no padrão que o seu parceiro esperava, você perdeu sua identidade”
Dr. Mário explica as diversas violências existentes: física, verbal, sexual, moral, psicológica, material, patrimonial. E que a violência psicológica afeta no mundo físico: interfere na alimentação, no sono, nas relações interpessoais. Já a violência simbólica exige do outro uma relação de confiança, como a senha do celular. “É importante fazermos essa reflexão sobre o quanto o outro pode entrar na nossa vida. Existe uma parte da nossa privacidade que deve ser preservada. Tomar o celular, invadir a privacidade de uma pessoa, controlar o que ela pensa ou acessa já é uma forma de violência.”
Ele complementa dizendo que “pedir desculpas não é uma forma de fazer tudo voltar a ser como era antes, mas uma forma de revelar o caráter da pessoa. Toda pessoa é um cristal, e se você tocar no fundo daquela pessoa de forma tão violenta, aquilo nunca mais vai se arrumar. Mas pedir desculpas é uma forma de você se tornar mais gente, com seu caráter revelado.”
O Juiz de Direito conclui sua fala com os seguintes conselhos: “É importante não nos calarmos diante de qualquer tipo de violência. Cada um de nós pode dizer, ‘olha, isso não tem graça’, isso é uma forma de desarmar conceitos antigos. Temos a escolha de decidir o que queremos ler e ouvir nesses tempos difíceis que estamos atravessando”.
Dr. Marcel traz a reflexão sobre masculinidade no ambiente corporativo
Dr. Marcel participa da conversa explicando como é lidar com pessoas diversas de maneira respeitosa e gentil, mesmo diante da pressão do ambiente corporativo. “A própria formação na área jurídica nos ensina a implementar a justiça e ter traquejo com as diferenças. Desenvolver pessoas no exercício da advocacia, uma profissão que carrega muitas tradições e formalismo, foi muito impactante para mim inicialmente. Mas a NWADV já é um espaço diversificado numa profissão historicamente masculinizada, então minha gratidão é por fazer parte de uma estrutura corporativa que já evoluiu neste sentido. Eu entendo que ainda existe um desafio, o mercado corporativo está em desenvolvimento para aceitar essa diversidade, seja sexual, de gênero ou racial. Identificar os desafios do colaborador é um caminho para a gestão adequar a realidade do mundo corporativo”.
Dra. Anne comenta que o comportamento agressivo do homem para se expressar e se posicionar são muitas vezes sentimentos internalizados, e que o mundo do trabalho tem valorizado muito mais as competências emocionais do que técnicas, o que é confirmado pelo Dr. Marcel: “Especialmente a área jurídica exige essa perspicácia de se expressar, e a vantagem da juventude é ter disponível espaços como esse, onde temas são colocados abertamente para que jovens possam se expressar, então esse tipo de conversa é super enriquecedora. Quem absorve este tipo de pensamento vai ter uma vida profissional muito mais leve. Minha dica é que cada um absorva um pouquinho do que foi dito aqui e se aprimore para uma futura carreira profissional”.
Professor Jalequison compartilha sua experiência pessoal e profissional
Passando a palavra para o educador Jalequison, ele inicia com uma provocação: “Como assumir a masculinidade em um ambiente de trabalho onde a maioria é formada por mulheres, especialmente a gestão?”
Ele conta que seus valores foram formados no próprio lar, já que seu pai foi criado por mulheres, e essa construção reverberou no casamento, onde ele dividia tarefas de casa e sempre houve essa relação de respeito e ajuda mútua. Todos os valores foram absorvidos pelo educador, que multiplica esse modelo de masculinidade entre seus alunos.
“Muitas vezes, dentro de casa a gente não tem uma formação sobre o respeito às outras pessoas, com seus direitos e deveres. Então a desconstrução acontece nos nossos ambientes de trabalho e de estudo. Em nosso projeto essa reconstrução acontece, e muitas vezes não é por palavras, mas por atitudes: seja acolhendo ou abraçando. Os jovens não estão no nosso espaço apenas para entender a teoria, mas também para se formar como cidadão.”
“A base principal de tudo é o respeito. A partir dele, todos os outros assuntos ficam acessíveis. Nós trabalhamos com pessoas de pensamentos diferentes, então é importante saber lidar com o outro.” O educador concluiu sua fala dizendo, “a partir do que eu vivi, o conselho que eu deixo é que ninguém precisa comprovar masculinidade para o outro. Muitas vezes somos provados, até para ser aceito em um grupo, mas se você se aceita como a pessoa que você é não precisa provar mais nada a ninguém”.
O INW agradece os mais de 160 ouvintes e a disponibilidade e abertura dos convidados em compartilhar sua trajetória pessoal e profissional, que certamente vai inspirar as novas gerações.